quarta-feira, 20 de abril de 2011

Contos das Encruzilhadas




Essa noite foi insana. A recompensa ideal pelos nossos desmandos frenéticos e alucinados. As drogas eram poucas, os beijos não eram suficientes. Parecíamos donos das nossas esperanças e desgraças. Os risos eram altos, não havia pudor nem sangue frio. A madrugada fria só fazia o desejo arder nos acordes dos violões. A fogueira crepitava e iluminava os sonhos das garotas,  ao mesmo tempo que, quando passava algum carro, balançava de tal maneira que seus rostos desapareciam, e naqueles instantes, enquanto cantávamos, esquecíamos completamente de como elas eram. Teríamos muito mais a cantar, mas a tempestade se formou de repente. A fogueira apagou, só trevas e chuva nos restaram. As garotas ficaram sem rosto e paramos com a música. Ás vezes os relâmpagos nos mostravam seus olhos, mas não haviam sonhos lá. Embaixo de um abrigo precário, vimos um vulto na tempestade, também sem rosto. O vulto que costumamos ver em histórias que não acabam bem. O vulto andou  e passou como se não existíssemos, era um homem e arrastava uma enorme bolsa, como se ali estivesse todo o peso do mundo e dos seus erros. À luz dos relâmpagos vimos suas asas, incrédulos, apenas terminamos nossas bebidas e partimos, deixando para trás as garotas sem rosto, a música e os sonhos. Se anjos se arrastavam entre nós, era melhor partirmos, sem esperanças. E assim foi, sentimos o vento e ao último gole do vinho, sabíamos que havia sangue a ser derramado, e quando virássemos as costas, as mulheres sem rosto teriam seu destino selado. Pelo menos, nas suas lápides, elas teriam nomes. 

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