sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Editorial: E Se Você Estivesse em Frankfurt?

Allan Luis 


Ser escritor é um paradoxo. Sempre foi. Um luto eterno pela falta de tato da sociedade com as palavras, uma agonia calculada em cada linha, cada página e ainda, depois disso tudo, uma guerra sem escrúpulos para ver suas poucas palavras perdidas no imenso mundo do mercado editorial, em alguma gaveta ou e-mail de editor famoso.  É encarnar-se diariamente para um mundo onde a ignorância é uma bênção, e parece que somente os letrados vão pagar o preço dos pecados capitais.
Há um certo desconforto no ar do universo literário brasileiro, e isso não me compete julgar, pois o mainstream que vemos dominar a música, o teatro, a televisão e o cinema também está na literatura. Uma literatura de indústria, feita para vender, sob fórmulas que, não duvido, tenham sido criadas por Ford, ainda na satanizada Revolução Industrial. Satanizada sim, mas que é diretamente responsável pelo seu iPhone, celular ou laptop, ou qualquer outro gadget que você utilize, mesmo não sendo um capitalista, ou empunhando aquela bandeira de luta operária.
Nos últimos dias, percebemos esse desconforto de maneira mais nítida. Já com meus botões eu refletia sobre como Marta Suplicy chegou ao ministério da Cultura, e decidi não pensar mais nisso, para poupar-me de infortúnios, ou um mal súbito.  Mas é o tipo de situação que sempre soubemos, não tinha nada para dar certo. 
Agora vamos contemplar tudo isso, junto com uma feira de renome internacional. Evento importante para a classe cultural, pelo menos se acredita nisso. Lá estarão, entre autoridades, grandes editores, artistas do  gênero literário, os best sellers, enfim, a nata, num ambiente claramente diferente do que consideramos por aqui como intelectual. 
Coloque nessa receita Paulo Coelho, aquele mesmo, do livro do alquimista, da bruxa, do mago e que chorou à margem de alguns destes rios europeus, talvez por que não quisesse chorar no São Francisco ou no Iguaçú. Paulo Coelho não quis ir ao evento por que achou que nossa delegação estava elitizada demais, intelectualizada demais,  e ficou revoltado por não chamarem os autores mainstream, que estão vendendo muito, apesar de muito pouco ou nada dizerem.  O mago é esperto, e provavelmente levantou uma questão importante sobre nosso consumo literário, as razões do envolvimento do mercado e da banalização da literatura. Pode até ter sido sem querer, mas Paulo Coelho acaba por nos fazer um favor, o da reflexão. Pois se você ainda não tinha prestado atenção nos motivos que fazem Felipe Neto vender livros, saibam, que não é por causa do estilo que ele adota nos textos. 
Sim, se a literatura comercial é a dominante no Brasil, eles têm todo o direito de estar na feira. Se Paulo Coelho é literatura, Felipe Neto também é, e todos os outros que pagaram ou tiveram influência e sorte suficiente para estar nas estantes das maiores livrarias.  Mas enfim, ele não foi à feira, Ziraldo foi e passou mal, Michel Temer (conhece?) foi e foi vaiado no discurso, e o discurso de abertura da delegação brasileira foi feito por Luiz Ruffato. Ruffato é escritor, premiado, mas nem eu nem você conhecemos, por que os livros dele estão atrás dos livros de adolescentes, auto ajuda, dietas, Paulo Coelho e Felipe Neto nas entulhadas estantes das livrarias.  
E a feira, que era para ser de literatura, acabou sendo de política, como sempre, e Ruffato, num rompante de fúria, decidiu falar politicamente sobre o Brasil. Uma pena. Um assunto que ninguém merece ouvir numa ocasião que tem tudo para ser agradável. 
Paulo Coelho, o mago esperto, fez bem em não ter ido.

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